Gregory Pincus. Só para se ter uma ideia, ele é considerado
como uma das 100 maiores personalidades da história, junto com: Einstein,
Cristo, Confúcio, Colombo, Aristóteles, Maomé, Augusto César, Tomás Edison,
Beethoven, São Paulo, Mendel, Calvino e tantos outros líderes religiosos,
políticos, guerreiros, cientistas e políticos. Todos exerceram – bem ou mal -
uma extrema influência para a história. Apesar de não ser muito conhecido, Pincus exerceu
mais influência na humanidade do que vários personagens de fama mundial.
Ele desempenhou um papel importante no desenvolvimento da
pílula anticoncepcional, na década de 60 do século XX. Graças à pílula
anticoncepcional – pela primeira vez na história – a mulher pode efetivamente
controlar sua fertilidade, sem depender do seu parceiro. Isso não foi pouco.
Seu efeito na mudança dos hábitos e da moral sexual é inegável, embora muita
gente hoje não tenha consciência disso. De repente, as mulheres podiam ter
relações sexuais sem medo de engravidar, e essa nova circunstância provocou uma
mudança tanto em sua liberdade, quanto em seu comportamento.
Hoje existem centenas de milhões de mulheres que utilizam a
pílula anticoncepcional por todo o mundo. É interessante constatar que além do
efeito anticoncepcional, a pílula tem diversos efeitos benéficos além da
contracepção. Veremos isso em outra postagem.
É de se ressaltar que o pioneirismo pelos movimentos de
Planejamento Familiar foi encabeçado por duas mulheres: a enfermeira e ativista
Margaret Sanger,
americana e Elise
Ottesen-Janssen, norueguesa, na década de 40/50. Lutaram firmemente, contra
a opinião pública fortemente machista, da época. Lutaram pelo direito de todos
os casais e indivíduos de tomar decisões sobre seu comportamento reprodutivo e
o direito de ter informação, educação e serviços exigidos para regulação da fertilidade.
O surgimento da pílula anticoncepcional na década de 60
facilitou em muito esse movimento, que culminou quando a Conferência sobre Direitos
Humanos da ONU, aprovou a declaração de Teerã, incluindo o Planejamento
Familiar como direito humano.
A contradição que nós vemos hoje é que muitas feministas e
outras ativistas combatem o uso da pílula anticoncepcional, como se fosse um
grande perigo: tem hormônios, causa isso ou aquilo, é um “veneno” etc.
E a trombose?
Certamente muitas pessoas leem artigos ou postagens sobre
mulheres que tomam a pílula oral combinada e desenvolvem coágulos sanguíneos. Não
vamos demonizar a pílula. É bom lembrar que não existe medicamentos ou produtos
isentos de risco. A questão é colocar na balança.
Uma trombose venosa é um coágulo na veia, geralmente
diagnosticado na perna, onde pode causar dor, inchaço e descoloração. Esses
coágulos podem se desalojar e viajar pela corrente sanguínea até o pulmão,
resultando em embolia pulmonar. Esses eventos são denominados coletivamente de
tromboembolismo venoso (TEV).
Muito ocasionalmente, pode ocorrer um coágulo nas grandes
veias que levam o sangue para longe do cérebro. Isso é conhecido como AVC e é geralmente
grave.
As estimativas do risco de tromboembolismo venoso, entre
usuárias de pílula variam entre 1,5 a 7 vezes mais chances de apresentarem um
TEV do que pessoas que não usam contracepção hormonal.
Embora este seja um grande aumento relativo, o número de
pessoas afetadas ainda é pequeno. Por exemplo, em um grande estudo usando
sistemas de registros de saúde dinamarqueses, a taxa de TEV foi de cerca de 4
em cada 10.000 mulheres que não usam qualquer forma de contracepção hormonal
por ano. Em comparação, a taxa entre as usuárias de pílula na mesma faixa
etária foi de cerca de 4 a 16 por 10.000 por ano, dependendo do tipo de pílula.
Já o risco de TEV na gravidez e o período pós-parto é muito
maior, de cerca de 40 a 65 em cada 10.000 pessoas após o parto por ano.
Contextualizando o
risco
É crucial explicar um pouco sobre risco relativo. Ouve-se
falar ou se lê que algum medicamento aumenta o risco em 20% de algum efeito
adverso. Um certo número de pessoas vai interpretar de maneira errônea que 20%
de todos usuários desse medicamento adquirem este efeito adverso. Isto é completamente
errado.
Embora devamos tomar
medidas para impedir que isso aconteça, o risco real de morrer depois de
desenvolver um coágulo é muito baixo. De cada um milhão de mulheres que usam a
pílula, estima-se que entre três e dez mulheres morram a cada ano como
resultado de eventos de TEV atribuíveis ao uso da pílula. No Brasil seria um número
em torno de 100. Para colocar isso em contexto, o último levantamento do
Ministério da Saúde – feito em 2014 – sobre acidentes de trânsito diz que 1.357
ciclistas morreram naquele ano em todo o país. Em 2015, o Brasil registrou
1.738 casos de morte materna.
RESUMO
É evidente que muita coisa mudou desde 1960, inclusive em
contracepção. A ciência evoluiu bastante.
Primeiramente, a própria pílula anticoncepcional teve uma
longa evolução. A primeira pílula (Enovid) tinha uma dosagem 65x maior do que
as pílulas de hoje. Uma enorme variedade de métodos contraceptivos hormonais ou
não surgiu. As opções hoje são as mais variadas possíveis: DIUs, implantes,
anéis vaginais, injetáveis, preservativos, adesivos etc.
Cabe à mulher, devidamente informada e orientada pelo seu
médico - no seu inalienável direito - decidir pela melhor opção para ela. Mas,
a mulher deve também ter cuidado a respeito de possíveis notícias falsas,
manchetes apelativas, para que possa fazer uma avaliação crítica mais embasada
sobre sua escolha.
Palavras-chave: pílula anticoncepcional, Gregory Pincus,
Margaret Sanger, Elise Otessen-Janssen, risco relativo, trombose.
Prof. Antônio Aleixo Neto
Mestre em Saúde da Mulher pela Faculdade de Medicina da UFMG
Mestre em Saúde Pública pela Harvard University
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